A Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais), entidade investigada por descontos irregulares em benefícios do INSS, realizou movimentações financeiras consideradas atípicas que somam R$ 796,8 milhões entre 2022 e 2025, segundo relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) obtido pela Folhapress. O dado chama atenção em Presidente Prudente, já que todas as transações investigadas passaram por uma conta da confederação em uma agência da Caixa Econômica Federal localizada na cidade.
De acordo com o Coaf, dos R$ 397,3 milhões em créditos apontados como atípicos, R$ 376,5 milhões tiveram como origem o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, que financia aposentadorias e benefícios para segurados do INSS. Os valores, que deveriam estar ligados a ações sociais e de apoio ao agricultor familiar, foram rapidamente redistribuídos em operações pulverizadas para terceiros.
Um dos episódios mais emblemáticos ocorreu em 7 de junho de 2023. Após receber R$ 13,7 milhões do fundo da Previdência Social, a Conafer realizou, no mesmo dia, cinco débitos de R$ 900 mil, um de R$ 895 mil e dois de R$ 890 mil. O relatório aponta ainda que parte das empresas beneficiadas compartilhava o mesmo quadro societário, o que, segundo o órgão, “causa estranheza”.
Os números mostram a dimensão das movimentações em Prudente: de julho de 2022 a junho de 2023, foram R$ 250,8 milhões movimentados; de julho a dezembro de 2023, R$ 264,9 milhões; entre janeiro e maio de 2024, R$ 274,7 milhões; e de junho de 2024 a maio de 2025, mais R$ 6,4 milhões. Apesar de a sede da Conafer ficar em Brasília, foi em Prudente que se concentrou o fluxo das operações consideradas suspeitas.
Durante depoimento à CPI do INSS, o presidente da Conafer, Carlos Roberto Ferreira Lopes, negou qualquer prática de corrupção. Ele defendeu a atuação da entidade, afirmando que ela prestava serviços em quase 3.000 municípios, possuía 1.200 funcionários e auxiliava pequenos agricultores no melhoramento genético de rebanhos bovinos. “Não é possível que quem abre de segunda a sexta, trabalha das 8h às 5h, atende 2.950 municípios e pagou mais de R$ 80 milhões em impostos federais seja considerado de fachada”, declarou Lopes, em fala registrada pela Folhapress.
Apesar da defesa, o dirigente foi preso em flagrante ao final do depoimento por falso testemunho, após a comissão entender que ele “mentiu deliberadamente” sobre pontos centrais da investigação. Lopes pagou fiança e foi liberado horas depois.
A Conafer é atualmente a segunda entidade com mais descontos associativos registrados no INSS, segundo dados da CGU (Controladoria-Geral da União). Foram R$ 484 milhões descontados entre 2019 e 2024, ficando atrás apenas da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), que recebeu R$ 2,1 bilhões no mesmo período.
Para o advogado da Conafer, André Hespanhol, não há irregularidades. Ele argumenta que os bloqueios judiciais atingiram toda a estrutura da confederação, prejudicando inclusive atividades não relacionadas ao INSS. “Existia sim uma instituição que prestava serviços em mais de 3.000 municípios. Os bloqueios de 100% dos bens e valores afetaram diretamente 1.200 funcionários e milhares de associados”, disse, criticando ainda o vazamento de informações sigilosas.